Agora nem nómada, nem emigrante.


domingo, fevereiro 20, 2011

H #10

Imagem de Eli


Estava a lavar as mãos, frágil, mal me segurava em pé, quando resolvi chamar por ele. Não me respondeu. Comecei a duvidar da sua espera, mas logo pensei que não iria embora sem mim. Foi então que ouvi uns passos e imaginei que devia ser ele.

Pela sombra no chão, reparei que não era. Comecei a sentir medo. Estava na casa de banho masculina e um homem desconhecido iria entrar. Pensei em andar o mais rápido que conseguia. Vi-o. Possuía uma grande estatura. Estava vestido com umas roupas sujas. Abriu um sorriso mórbido, negro. Assustei-me. Queria fugir, mas não tinha por onde. Parou junto à porta e olhou-me com os olhos esbugalhados de raiva. Cheguei-me para trás. Avançou com três passos firmes, agarrou-me nos pulsos e encostou-me à parede. Comecei a gritar umas vogais quase mudas. Pôs os seus pés em cima dos meus para que não me mexesse. Quando me largou um braço para me levantar a saia, dei-lhe uma bofetava com toda a força que ainda me restava. Ele fez-me o mesmo. Só que foi tanta a violência que caí no chão. Pensei em desistir. Comecei a chorar. Ele grunhia. Quando se baixou, dei-lhe um pontapé entre as pernas, rebolei-me e consegui sair dali. Escapar-me, escapar, pensava, pensava. Senti que ele não tinha vindo atrás de mim. Quando cheguei cá fora, senti o Sol forte a bater-me nos olhos e não conseguia ver. Mesmo assim não parei de correr pela praia fora. Quando senti a água do mar debaixo dos pés, olhei para trás, vi que estava sozinha, então deixei-me cair. A água fria ia e voltava. Sentia dores no corpo todo. O mar beijava-me a face. A água salgada misturava-se com o sangue. A pele ardia-me.

Não sei exactamente quanto tempo depois, o H apareceu e perguntou-me o que tinha sucedido. Não consegui falar, nem tampouco tinha forças para sair dali. A água tinha-me anestesiado. Era a primeira vez que tomava banho de mar num Inverno profundo. Levou-me até à areia seca.

H : Tinha ido buscar-te água. Toma, bebe.

E eu só consegui chorar no seu colo.

Eli

12 comentários:

mfc disse...

O conforto sempre chega! É uma questão de tempo...
Os pesadelos também nos permitem "ver" que a vida afinal é bem melhor que o melhor dos pesadelos!
E quando assim é(eu disse, quando assim é...) está tudo bem.

Unknown disse...

Gostei do seu texto, curto, mas rico, quer na forma, quer na substância.
Acho que vou voltar para a ler mais.
Bom resto de Domingo.

Rafeiro Perfumado disse...

Uma estalada e um pontapé? Se ela estava aflita dos intestinos era te-lhe mandado um peido valente!

Pedro Gaivota disse...

Quem é esse H, afinal?
E já agora, com o novo acordo ortográfico, OTÁRIO escreve-se com H?

Beijinhos

PS: Já agora se voltares a passar pelo mesmo aconselho-te:

http://www.youtube.com/watch?v=z3vDTIeV2h8

Eli disse...

mfc

Infelizmente, quanto maiores forem as provações, melhor nos sabe o tal conforto que chega sempre... ainda bem que alguns pesadelos não passam disso - imaginação.

:)

Eduardo Aleixo

Agradeço a sua leitura do meu texto e fico contente por querer voltar!


Rafeiro Perfumado

Tens sempre aquela palavra que faltava para completar o meu texto - o tal toque de humor. Mas, é só mesmo um toque, não é o telefonema todo!

:)


Pedro Gaivota

Qualquer semelhança com a realidade é coincidência! Isto trata-se de um "conto" ou tentativa disso, enquanto me der para o escrever. Olha, não era para ter sido, inicialmente, mas há coisas assim e adaptei-me à realidade do blogue e aos pedidos para continuar a escrever!

:))

nuvemdoce disse...

Estou em pulgas, para seguir esse conto, mas deduzo que no seguimento de uma tempestade vem sempre uma bonança, por isso aguardo ansiosamente aquele momento "click" onde vamos levar a imaginação para porta fechada...lollll..

Conlincência que o pequeno almoço é só ás 10h00...BÔ NÔTE!!...

Muito bom Eli. Continua!!..

Beijokas

Manuel Luis disse...

A minha sombra é a minha melhor companheira. Mete-se na agua e não se molha, não ralha comigo e nunca me larga apenas tem medo das nuvens.Ajuda-me a procurar o melhor local para dar o próximo passo.
Cumprimentos

IM disse...

Tou a gostar da história, embor este tenha sido um excerto um pouco trágico... mas como alguém tanbém já disse atrás depois da tempestade vem a bonança... e quando chega, sabe tão bem! :))

Obrigado pelas tuas visitas no meu espaço!

Daniel C.da Silva disse...

Gostei, mas posso subverter o teu texto? Em vez da tentativa de abuso do outro homem, tu estarias apenas irada com um tal H porque te tinha deixado sozinha na praia e estando tu prestes a ir embora, com acessos de raiva e morta de sede, eis que ele regressava, por fim, e ante a tua ira e reprovação ele respondia:

"Tinha ido buscar-te água. Toma, bebe." E tu só terias conseguido chorar no seu colo. ;)

O que tento dizer é que gosto sempre imenso de te ler, tens uma maneira muita própria de usar as palavras (eu sou mais terra-a-terra) mas por vezes também podemos transformar pesadelos em poéticos sonhos ;)

Bjs, Eli

Eli disse...

nuvem doce

Que bom que gostaste! Volta sim e faz-te notar.

:)



Manuel Luís

A nossa sombra não é mais do que o nosso reflexo...

:)



Sus

Vamos lá ver o que sai da próxima vez! Obrigada eu por teres vindo e comentado. Não precisas de agradecer.

:)



Daniel Silva (Lobinho)

Podes comentar da forma como melhor entenderes. Eu leio tudo com atenção! Agradeço-te por leres o que aqui escrevo e por comentares também. É muito bom para mim ler os comentários atenciosos e sugestivos.

Eu também tenho o meu lado prático, o tal "terra-terra". No entanto, quando escrevo, não consigo evitar de deixar fluir a imaginação e a inspiração...

:))

Anónimo disse...

Um pontapé entre as pernas? Que golpe baixo, atingir o sr nas partes baixas. Também ele deve ter ficado com dores de ''barriga''. lol
:))


em_segredo

Eli disse...

em_segredo

Uma pessoa não se lembra de tudo!

:P