Agora nem nómada, nem emigrante.


domingo, maio 19, 2013

Verdadinhas





Não costumo dizer a verdade toda, aqui... ou raramente o fiz.
Admiro as pessoas que contam as suas verdades nos blogues sem as camuflar.
Mas, eu habituei-me a esconder parte, a escrever só para alguns... num mistério capaz de enebriar.

Eli

sexta-feira, maio 17, 2013

Antecipação





Queria chorar-te. Queria, sabes, porque talvez assim me livrasse de ti. Não sei por que me agrada o cheiro a cinzas, não sei por que razão comigo as coisas têm que ser assim tão estupidamente difíceis. Deixem-me amar naturalmente. Eu sei, eu faço sempre por isso. Sabes, não aguentei mais e fui eu mesma, como sempre. Não sei o que é fazer-me de outra coisa que não eu, mas por que razão não és tu também. Por que deixaste que a dor te transformasse?! Ela levou-te de mim, aos poucos e... mais tarde eu volto a olhar as palavras escritas com um significado maior, mais do que naturalmente seria viável. Não quero ser só racional, não quero abandonar aquela imagem de simplesmente dar um passo em frente. Preciso que aconteça! Acontece-me...

Eli

Snow Patrol - Run (Live @ Rock in Rio)

quinta-feira, maio 16, 2013

Familiar

Por vezes precisamos de sair do quadrado
Dar as mãos formando um círculo
Esquecer as linhas retas
Aprender a circundar

Só circulando, aprendemos a união

Abracemos os justos
Aprendamos a amar

Tragam-nos o vosso coração
E ficaremos juntos, lado a lado
Mesmo ao longe, mesmo ao perto

Às vezes perdemos alguém
Dá-nos cá dentro um aperto
Mas, depois, vem alguém
E lembra-nos como é sentir

Ter uma alma familiar
Que não se cansa de nos acolher

Voltamos a sorrir
Voltamos a caminhar
Mesmo sem saber.

Eli Rodrigues

segunda-feira, maio 13, 2013

Francisco #7





Ele respirou fundo numa derradeira tentativa:
- De onde vens?
- Açores, S. Miguel.
- Gostava muito de ir visitar os Açores!
- E eu gostava imenso de ir a Paris! – Esforcei-me.
- Eu não estou em Paris, mas é lá que passo os fins de semana, em casa da minha tia. Se não fosse ela, não teria vida nenhuma lá. Já conheço os cantos todos à cidade, graças aos mapas que ela me desenha.
- E ela não vai contigo?
De repente, ouço o meu telemóvel, som de mensagem.
O Ricardo respondeu «e eu da lua até aqui. Quero-te.»
Senti um calor invadir-me as faces.
- Namorado. – Disse o meu companheiro de viagem, aliás, o colega de banco.
- Não…
Olhei pela janela e não dissemos mais nada durante algum tempo. Anoiteceu. Eram  quase vinte e uma e trinta. Ele pegou no telemóvel para também ver as horas.
- Vens cá por quanto tempo? – Perguntei, finalmente.
- Ainda não sei bem. Não sei sequer se volte. Tenho cá a minha velhota que já está um bocado acabada e precisa de mim para arrebitá-la.
Pensei nos meus. Pensei que também havia quem precisasse de mim se eu deixasse.
- Também vais sair em Aveiro, não é?
- É. Tenho um amigo que me vem cá buscar, porque vou para Mangualde.
Logo a seguir, não sei porquê, dei-me conta que ele também teria sido aquela pessoa que chegando ao aeroporto de Lisboa, não teria tido ninguém à sua espera.
Como os meus pensamentos eram egoístas.
À saída da carruagem, ajudou-me a carregar a mala e, seguidamente foi buscar as suas duas. Agradeci-lhe e dissemos um “adeus” rápido de quem não se tornará a ver, jamais.
De soslaio, ainda o vi abraçar o amigo. A minha garganta ficou apertada, mas ninguém sabia. Olhei à minha volta e eu era a única pessoa sozinha e parada no meio da estação.
Então, disse baixinho:
- Aveiro, cheguei.

Eli

domingo, maio 12, 2013

Francisco #6







Estivemos a conversar um pouco. Desta vez não imitei o sotaque micaelense, senão teria muito que explicar.
Ele reparou que eu estava muito cansada para fazer conversa, quando olhei pela janela e não lhe respondi prontamente.
Esboçou um sorriso e pediu-me desculpa. Disse que se sentia sozinho há muito tempo por não ter ninguém com quem falar português.
Fiquei logo com muita pena dele, mas também de mim. Eu pensava precisamente o mesmo. Não falava com ninguém, havia algum tempo, mas no meu caso a culpa era minha. Tinha sempre medo que percebessem o meu estado de espírito. Esse receio estava tão camuflado que nem eu mesma reparava na sua existência.
- Reparei na grande mala que trazias. Nunca tinha visto uma tão enorme. – Fez uma pausa, gesticulou e prosseguiu. – Dava-me jeito uma assim, em vez de ter que andar com duas. Posso saber onde é que a compraste?
- Já nem me lembro bem…
Peguei nos fones, coloquei-os nos ouvidos e ele calou-se.
Fiquei com muita pena de mim mesma. Já não conseguia sorrir e ser simpática como antigamente. 

(Continua.)

Eli

sábado, maio 11, 2013

Francisco #5






E agora, estava ali o Ricardo. A distância física nunca nos fez abrandar na loucura e na procura. Traidor! Ele traíra os meus sonhos! Eu gostava demasiado dele para ficar uma semana inteira sem saber dele. O nosso desejo era tão poderoso… como poderia eu abandoná-lo?! Reticências, por favor, deixem-me em paz. Tenho que deixar o Ricardo no passado.
Seguidamente, reparei que já não ouvia a voz dele, nem o riso dela. De repente, virei-me sem pensar mais e a mesa estava vazia! Ninguém! Ninguém! Como poderia eu ter deixado escapar esta oportunidade para o confrontar?!
Olhei para o relógio e faltava apenas meia hora para voltar à minha cidade. Ah, Aveiro, por favor, chega depressa. Acabei a minha “Fanta” e segui tendo por companhia apenas a minha grande mala e a minha mochila, onde passeava o meu computador.

Já no comboio, vi-me aflita para arrumar aquela mala. Quando consegui, fiquei com receio de a deixar ali longe de mim, junto à entrada/saída da carruagem, mas não pude fazer nada quanto a isso. Abracei a mochila e sentei-me. Reparei como me sentia cansada.
Ao meu lado, sentou-se um rapaz. Ele disse como se chamava, mas como eu ainda tinha o Ricardo na cabeça, não me lembro do nome do simpático. Confessou-me que tinha chegado de avião ao aeroporto de Lisboa e que era emigrante. Estava na França há já alguns anos. Notava-se que apesar de novo, tinha um aspeto muito desgastado. Fiquei a pensar que eu deveria aparentar o mesmo.
Talvez estivesse na altura de começar a usar um creme antirrugas.

(continua)

Eli

sexta-feira, maio 10, 2013

Francisco #4






Pelo canto do olho, no campo visual permitido disfarçadamente, apercebi-me que a companhia dele era uma mulher loira e bonita. Apetecia-me levantar-me e gritar-lhe que aquela era a nossa expressão! Afinal ele deveria usa-la com todas… senti-me ainda mais cabisbaixa.
Então, lembrei-me de uma coisa! Podia enviar-lhe uma mensagem.
Então escrevi: «Gosto de ti até à lua e da lua até aqui.» Eu sei que não tinha o direito de fazer isso, mas havia muito tempo que não falávamos e eu queria provoca-lo!
Ouço o som de mensagem do telemóvel dele a tocar precisamente atrás de mim. Confirmei, sem o ver, que era mesmo ele.
Pensei em virar-me, mas logo depois perdi a coragem. Pensei no trabalho que tinha tido a esquecê-lo. Aquele mês nos Açores fizera-me mesmo bem. Nunca mais me tinha lembrado dele. Foi um mês abençoado. Viver junto ao mar tempestivo de inverno em S. Miguel. Nada melhor para a vida dar uma volta de cento e oitenta graus.
Fechei os olhos, abri o meu diário e escrevi. Ainda estou a escrever. Sorrio. A escrita sempre me fizera companhia. Lembro-me de ficar a noite inteira a escrever até amanhecer. Que loucura! Já tinha páginas e páginas só de sentimentos.

 (continua)

Eli