Agora nem nómada, nem emigrante.


quarta-feira, abril 20, 2011

Maldição



Era uma vez um menino. Era maldito. Nasceu assim. Cresceu assim, como que assombrado por uma informação que lhe foram passando dia após dia, década após década. Nunca fora adorado, nunca desejado, nunca sequer maltratado, não fossem os deuses descerem à terra e vingarem-se. Por detrás de um olhar escuro, escondia-se uma sombra sombria. Sua mãe esquecera-o logo no berço, ainda amamentava e já o leite lhe escorria pelos seios, tal era a falta de amor que lhe transbordava... aqui nem era água, seria uma mescla esbranquiçada.

-Mas, por que não o alimentas.
-Meu alimento não o sacia.

Os negros olhos da criança foram perdendo o brilho e cresceu pelos montes, olhando de soslaio os humanos. Sentia-se um cavalo. Era livre como eles.

Sua famíla de gentes abastadas de pobreza de espírito deixava um caldo e um naco de pão à porta dos estábulos... não... eram currais mesmo.

Foi mandado para a escola. Aprendeu a ler e só aí descobriu que nem todos eram como ele. Estranhamente se sentiu especial. Tinha qualquer coisa que os outros não tinham.

Um dia, chegou à escola montado num cavalo bravo e todos lhe fugiram. A fama de tolo ganhou finalmente proporções maiores. Então, fugiu. Escapar a toda aquela merda foi um toque de desolação por não terem mais quem lhes limpasse o esterco, mas também um alívio-

- Que leve a maldição com ele.
- Qual maldição?
- Não sei.

O padre tinha dito que aquela marca no pescoço era do demónio. Havia uma lenda. Quem assim nascesse traria décadas de horror à sua terra. Porém, que se tinha livrado da porcaria, com quinze anos mal feitos foi aquele pobre rapaz.

Fez-se soldado quando encontro outros pelo caminho. A sua destreza em dominar cavalos selvagens trouxe-lhes uma grande fonte de rendimento. Nunca tinham visto a sua marca. Estava tapada pelos longos cabelos, que assim como a barba, foram crescendo dia após dia. Cortava as pontas com a sua velha navalha.

Certo dia, estava a dormitar junto ao rio, com o chapéu a tapar-lhe a cara, quando ouviu um barulho.

O som de um tiro e logo a seguir a morte. O falecimento...

Eli



Este espaço começou com o lugar dos seguidores "há pouco tempo" e conta com cem. A quantidade não é significativa. A a maioria dos que vêm cá ler mais vezes não é seguidora e nem deixa comentário, mas vivo bem com isso, porque a aceitação faz parte da minha condição.

Porém, não posso deixar de agradecer ternamente aos que comentam, muitas vezes sem eu merecer.

Seis anos de blogue. Esta é a minha casa mais duradoura, mais minha e a que me conhece mais intimamente. Sintam-se convidados a partilhá-la. Há várias divisões, imaginárias, mas nunca deixando de ser eu que as descreve, assim como o que se lá passa...

O amor acontece.

13 comentários:

Nuno V. P.de Melo Ferreira disse...

Se não tivesse morrido, era eu. Menos a parte da amamentação: foi logo de biberon, que mesmo esses seios sequei. :-)

Parabéns. Venham mais 6.

Rafeiro Perfumado disse...

Não sei se me atrevo a comentar, aqui levam-se tiros sem razão aparente... ;)

Beijoca e parabéns pela marca blogueira!

Me,myself & I! disse...

Que giro!

Poetic Girl disse...

E como a gente gosta de cá vir! beijoooo

IM disse...

Bem, não há muito a dizer... sou recente nas visitas, mas já gosto daqui :)

Parabéns pela casa!

Beijooooooooo

mfc disse...

Há pessoas que não merecem a morte e este personagem era certamente um deles!
Se eu pudesse... ohhh se eu pudesse, torceria por outro final!
Toma um beijinho.

Eli disse...

Numenor

«...já o leite lhe escorria pelos seios, tal era a falta de amor que lhe transbordava...»

Aqui lês que a mãe preferiu que o leite lhe escorresse até secar em vez de o amamentar.

A minha inspiração surge do que rodeia, das ideias que pairam, das histórias que leio...

:))



Rafeiro Perfumado

Quando se tem medo de uma história ainda se é pequenino.

Obrigada e não é competitividade, nem anseio que tal seja, porque não trono para não ser destronada (lol)!

:)


Me,myself & I!

Ainda bem que gostaste!

:)


Poetic GIRL

E eu gosto que venham. Nota-se, não é?!

:)

Sus

Recente ou não, preenches a casa com a tua assiduidade que agradeço muito.

:)


mfc

Quando estava a escrever, não sabia como ia acabar, acreditas?! Depois, achei que estava a ficar grande demais e acabei-o.

Sempre ouvi dizer que quando queríamos acabar uma história, bastava matar os personagens! (lol)

:)

Fátima Santos disse...

Tens uma escrtita mto própria, da qual acho mto interessante!Parabéns pelos 6 anos de blogue! beijinhos :)

Eli disse...

Fátima Santos

Obrigada. Penso que cada um tem uma maneira própria de escrever, pois só cada um sabe/sente aquilo que lhe vai na alma.

Bjinhos para ti.

:)

nós disse...

não sou seguidora inscrita, nem comentadora registada, mas sou leitora assídua.
gosto muito!
aliás, embora não o mostre, gostei muito de te conhecer!
beijinhos
parabéns e continua!
AMargarida

Eli disse...

AMargarida

Nem imaginas como me soube bem ler o teu comentário. Aliás, deves fazer uma ideia e foi por isso que o escreveste. Olho para trás e vejo-te na minha vida há um ano atrás, com um gosto enorme por teres partilhado comigo tantas emoções e vírgulas e... agradeço-te muito por continuares a vir, assim como por teres comentado desta vez. Tu sabes que eu também gostei muito de te conhecer e que embora ausente, continuas na minha vida.

Abraço.

:)

Anónimo disse...

E acreditava eu que esse sorriso que exibes era reflexo duma alma feliz, terna, solidária,...Afinal é apenas a expressão dessa mente maquiavélica e do gozo que te deu dar dois tiros no pobre rapaz...

Malvada!

Eli disse...

Oficial e Cavalheiro na Reserva

Omeu sorriso não esconde, revela... embora a sua leitura seja deveras enigmática, tal como mulher que sou - mavada?! (lol)

:)